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quinta-feira, 17 de abril de 2008

FÍGADO E MEDICAMENTOS




Prof. Rui Marques dos Santos



O fígado, o maior órgão do corpo humano, tem uma localização central para melhor desempenhar as suas inúmeras funções. Um quarto do sangue total passa pelo fígado em cada minuto; a maior parte tem origem nos intestinos, facilitando assim a função de filtro desempenhada pelo fígado.



Os alimentos que comemos ou os líquidos que bebemos são absorvidos no intestino e, ao entrarem na circulação são obrigados a atravessar o fígado antes de poderem alcançar outros órgãos ou circularem no sangue. De igual modo, sucede com todas as substâncias que, à semelhança dos alimentos, forem introduzidas no organismo pela boca, como sucede com os medicamentos, comprimidos ou soluções orais.


Outra das funções hepáticas é a metabolização das substâncias que se encontram em circulação, sejam elas provenientes do exterior ou do interior do organismo.


Esta metabolização tem por finalidade tornar inofensivo, o que pode ser agressivo, ou permitir eliminar do organismo essas substâncias pelas fezes ou pela urina. A este processo de biotransformação chama-se destoxificação. A quase totalidade dos medicamentos sofre uma transformação quando chega ao fígado.


A maioria dos medicamentos é lipossolúvel, dissolve-se em gorduras, mas para ser eliminado pela urina necessita ser hidrossolúvel, possibilidade de se dissolver na água. Este processo de destoxificação divide-se em duas fases. Na primeira, dá-se uma transformação e, na segunda, uma associação a outras substâncias.




Relação complexa entre fígado e medicamentos



Podemos agora compreender como a relação entre o fígado e os medicamentos é complexa e se pode analisar considerando vários aspectos: as alterações que o fígado provoca nos medicamentos; o medicamento como tratamento das doenças do fígado; e o medicamento como causa de doenças do fígado.


Os medicamentos metabolizados no fígado podem tornar-se mais ou menos activos consoante os produtos daquela metabolização (metabolitos) têm ou não actividade. Se um medicamento é activo e a sua transformação hepática o torna inactivo, a existência de doença hepática que atrase a transformação do medicamento pode aumentar a actividade do medicamento e para obter o mesmo efeito será preciso menos quantidade.


Pelo contrário, se o medicamento não é activo e apenas o metabolito apresenta actividade, a deficiência hepática pode ser responsável pela falta de eficácia do medicamento. As doenças hepáticas também são tratadas com medicamentos, mas infelizmente existem poucos medicamentos específicos para as alterações do funcionamento hepático. Muito frequentes são as doenças hepáticas resultantes da utilização de medicamentos. A estas, damos o nome de hepatites tóxicas ou com maior abrangência hepatotoxicidade medicamentosa.




Dois tipos de toxicidade


Consideram-se dois tipos principais consoante se pode prever a sua toxicidade ou, doutra forma

é ou não dependente da dose. A toxicidade intrínseca é aquela que atribuímos ao medicamento de modo constante e que apenas depende da dose; quando se ultrapassa determinada quantidade provoca danos em todas as pessoas.


A toxicidade idiossincrática é aquela que só aparece em algumas pessoas e por esse motivo não a podemos prever. Como exemplos podemos apresentar dois medicamentos muito conhecidos: o paracetamol (Ben-u-ron®) e o ácido acetilsalicílico (Aspirina®). O paracetamol tem toxicidade conhecida, provocando lesões em todos os doentes quando administrado em quantidade superior a quatro gramas por dia. O ácido acetilsalicílico também têm toxicidade hepática mas não é possível dizer que doente vai apresentar lesões hepáticas.




Rui Marques dos Santos


Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra






Fonte: Jornal do Centro de Saúde