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sexta-feira, 14 de dezembro de 2007

PRISÕES NÃO SABEM COMO VÃO APLICAR A LEI

É possível que só se permita fumar no exterior
"Ainda não se fez uma adaptação das prisões à aplicação da lei", reconhece o director-geral dos Serviços Prisionais, Rui Sá Gomes. "Já adquirimos os dísticos 'proibido fumar', mas ainda não decidimos se se vai poder fumar nas celas ou não. Depende daquilo que a Direcção-Geral de Saúde (DGS), à qual pedimos um parecer, nos diga. Se disserem que é obrigatório colocar extractores de fumo ou ventiladores em cada cela, não vai ser possível fumar nas celas, porque não tenho orçamento para isso." A possibilidade restante seria a de permitir fumar nos espaços exteriores - pátios, etc. - e em locais expressamente reservados para o efeito. Mas também estes têm de obedecer a regras estritas: ventilação própria e separação das restantes áreas. A Direcção-Geral acordou tarde para a realidade de uma lei aprovada a 14 de Agosto? Rui Sá Gomes acha que não: "Bom, há coisas em que é só preciso decidir se se fuma ou não. E se não houver hipótese, não se fuma dentro dos edifícios e pronto.

"Uma possibilidade que, não nega, "será geradora de tensões": "Se não puderem fumar vai ser complicado." Afinal, segundo o levantamento que o director-geral ordenou que se efectuasse nas últimas semanas, metade dos 12 mil reclusos têm o vício do tabaco. E estão habituados, como todos os outros fumadores, a fumar em quase todo o lado: só nos refeitórios e nos serviços clínicos era interdito o fumo. Celas, corredores, bares e demais espaços eram zona franca. O que significa, naturalmente, que os seis mil não fumadores eram forçados, mesmo dentro das celas colectivas (onde os reclusos passam uma parte substancial do tempo, já que de um modo geral são encerrados a partir das cinco ou seis da tarde e só podem sair às seis ou sete da manhã) a conviver com o fumo dos outros. Agora, a situação inverte-se. E a reacção dos fumadores, prevê-se, será bem mais notória que a dos não fumadores.
Janelas não são ventilação
Certo é que há dois meses, quando o DN contactou pela primeira vez os Serviços Prisionais para averiguar da forma como tencionavam aplicar a lei, Rui Sá Gomes estava tranquilo. "É necessário impor regras mas há muito pouco a adaptar." Para o director-geral dos Serviços Prisionais, a resolução do problema parecia simples: "Vai haver celas para fumadores e para não fumadores." A coisa só se complicou quando Rui Sá Gomes foi informado pela DGS de que as janelas, existentes em cada cela, não constituem, do ponto de vista da legislação, mecanismos de ventilação adequados. Tomou então a decisão de solicitar um parecer à DGS. Que adiantou ao DN a eventual solução: "É possível criar alas para fumadores, desde que exista separação física - e aí, em princípio, não será necessário instalar extractores ou ventiladores nas celas", diz Nina de Sousa Santos, a jurista da DGS que tem estado a analisar a lei para dar indicações para a sua aplicação prática. Nas alas para fumadores, frisa, seria possível fumar até nos corredores, desde que não estejam em comunicação com os restantes espaços - ou seja, com as alas para não fumadores -, situação que em vários estabelecimentos prisionais é relativamente fácil de garantir, já que foram assim construídos (caso do estabelecimento prisional de Lisboa, por exemplo).
Um vício que "acalma"
O problema seria então reorganizar todo o sistema prisional em função da opção tabágica, o que não parece ser fácil. " Eles nem conseguem separar os doentes com infecto-contagiosas, quanto mais", comenta Jorge Alves, o presidente do Sindicato do Corpo de Guardas Prisionais. "Que eu saiba, ainda não há orientação nenhuma sobre a lei. Não ouvi falar de nada, nem de inquérito nenhum aos presos. Mas, como não fumo, para mim era bom que acabasse o fumo nas cadeias." Alves não tem dúvidas de que alguns colegas fumadores podem não gostar, mas ressalva: "Eles podem sempre ir à rua fumar. Para os presos é que é mais complicado, porque estão privados da liberdade e isto é um vício que os acalma um pouco."
Estado deve dar exemplo
Para dirimir os efeitos da entrada em vigor das restrições, Emília Nunes, que dirige a "pasta" da aplicação da lei na DGS, sugeriu aos Serviços Prisionais se criem consultas antitabágicas nas penitenciárias. "É também muito importante sensibilizar os reclusos para a lei. Claro que é necessário encontrar soluções para os fumadores, porque os presos não têm as alternativas que as pessoas livres têm. Estudar a criação de salas de fumo, por exemplo. Mas fumar dentro dos edifícios é sempre pior que fumar ao ar livre, porque não existe - é a Organização Mundial de Saúde que o diz - nenhum sistema de ventilação e extracção de fumos cem por cento eficaz na eliminação do fumo e das partículas. E no limite o não fumar tem de prevalecer. É esse o espírito da lei." E para esta médica é claro que deve ser o Estado - e as suas diversas instituições, o que obviamente inclui a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, "a dar o exemplo", não tergiversando na sua aplicação. Até porque quase toda a discussão sobre a lei tem incidido nos estabelecimentos privados - e estes verão qualquer falha do sector público como um álibi.
Fernanda Câncio

Fonte: DN de Lisboa