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terça-feira, 8 de janeiro de 2008

TESTES A MEDICAMENTOS JÁ ENVOLVEM CENTENAS

Nos últimos cinco anos, foram registados em Portugal 674 Ensaios clínicos + com medicamentos para uso humano, ou seja, a experimentação de fármacos para testar a sua eficácia e a sua segurança. Nesse período, a autoridade portuguesa do medicamento analisou outros tantos acontecimentos adversos graves. Significa que, por cada ensaio, pode ter acontecido uma morte, uma incapacidade ou o prolongamento de um internamento? O presidente do Infarmed + assegura que não.

"Como não conhecemos muito (sobre o medicamento), queremos garantir que não perdemos nada", explica Vasco Maria, pois a informação pode vir a ser útil no futuro. O exemplo mais clássico dado pelos especialistas em farmacovigilância é o do indivíduo que participa num ensaio clínico e morre num acidente de viação, enuncia António Faria Vaz, vice-presidente da Comissão de Ética para Investigação clínica (CEIC), o órgão cujo parecer é obrigatório para a realização de ensaios clínicos. Haverá uma relação directa entre o fármaco em estudo e esse episódio? Se o número de acontecimentos deste tipo for elevado e envolver um conjunto significativo de participantes no estudo, poderíamos chegar à conclusão de que o composto produz efeitos (afectação da capacidade de condução, por exemplo).

Mas quem diz um acidente, diz um internamento ou uma morte por uma causa não atribuída ao medicamento, anota Vasco Maria. Por isso se registam, se analisam e tomam decisões, como a de suspender os ensaios ou de inserir recomendações quanto ao uso do fármaco.

Ambiente cuidado

A pretexto da notícia da investigação criminal a uma morte, em 2003, alegadamente relacionada com um ensaio no Hospital de S. João (a única notificada), fomos analisar os relatórios do Infarmed dos últimos anos. Entre 2002 e 2006, estes dão como registados 674 ensaios e outros tantos acontecimentos adversos graves. Em 2007, até há poucos dias, estavam autorizados 100 ensaios e notificados 118 eventos adversos. "A maior parte não tem relação com os medicamentos em estudo", assegura Vasco Maria. Nos últimos anos, apenas um ou dois ensaios foram suspensos - e com problemas não detectados em Portugal - estima.

"Um participante num ensaio (saudável ou doente) está num ambiente extremamente cuidado e o rigor com que é acompanhado, através de exames e análises. À menor situação de risco, é imediatamente acompanhado", afirma o presidente da Associação dos Médicos Portugueses da Indústria Farmacêutica, Luís Laranjeira.

"De um modo geral cumprem-se as normas e as boas práticas", garante o vice-presidente da CEIC, fazendo uma avaliação "muito positiva" da actividade dos promotores dos ensaios - umas 70 a 80 companhias - e dos investigadores (meio milhar) em unidades de saúde que a comissão fiscaliza. Estes são responsáveis por um momento muito importante no longo processo de desenvolvimento do medicamento (infografia).

"Quando chega ao ensaio clínico, ainda há um grande desconhecimento do fármaco. Pode haver problemas que não foram detectados nos testes em animais. Apesar destes, sabemos pouquíssimo sobre os efeitos nos humanos, designadamente em termos de efeitos secundários", observa o presidente do Infarmed. Mesmo quando chega ao mercado, acentua, "só conhecemos a ponta do iceberg", pois pode haver efeitos graves que não foram detectados.


As lesões hepáticas, por exemplo, têm uma frequência de um por 500 mil indivíduos e dificilmente se detectam num ensaio com um fármaco que envolve quando muito cinco mil. Por isso se descobrem já em fase de comercialização, nota Vasco Maria. Este tipo de lesões contribui com 15 a 20% da retirada de medicamentos. Mas há outros que continuam à venda, porque os benefícios são maiores que os riscos. Se um medicamento causar umas dezenas de mortes por ano, justifica-se mantê-lo se salvar centenas ou milhares que morreriam se não fosse usado.
Fonte: JN