No espaço de seis meses, houve duas mortes devido a complicações pós-operatórias
As cirurgias no Hospital Central do Funchal + para combater a Obesidade + mórbida têm vindo a provocar alguns problemas. Os doentes são operados para introduzir um 'bypass' gástrico por forma a reduzir drasticamente o peso mas, só este ano, já morreram duas pessoas. Motivo: sepsis - infecção generalizada - devido a complicações pós-operatórias.
As cirurgias no Hospital Central do Funchal + para combater a Obesidade + mórbida têm vindo a provocar alguns problemas. Os doentes são operados para introduzir um 'bypass' gástrico por forma a reduzir drasticamente o peso mas, só este ano, já morreram duas pessoas. Motivo: sepsis - infecção generalizada - devido a complicações pós-operatórias.
Doentes há também que não morrem mas enfrentam uma morte lenta com as sequelas da operação, no seu dia-a-dia.
Nos anos anteriores, também há registos de mortes. Os familiares choram os entes queridos que, na procura da solução mágica para a obesidade crónica, encontraram inexplicavelmente a morte. E reclamam da consulta de cirurgia bariátrica do hospital - que segue estes doentes - e acham mesmo que os profissionais de saúde estão mais preocupados em mostrar serviço do que alertar devidamente os doentes para os elevados riscos desta operação, inclusive para a morte.
Especialista desdramatiza
Mas, para o hospital, os sucessos falam claramente mais alto do que os insucessos, estes últimos quase irrisórios nas estatísticas. Celso Silva é o médico que está à frente da Cirurgia II do Hospital Central do Funchal, que coordena a equipa ligada à cirurgia bariátrica, e tem uma versão dos acontecimentos menos alarmista. Desde logo, explica que "em 80 cirurgias realizadas este ano para implantação do 'bypass' gástrico (o recurso actual standard), houve duas mortes", pelo que afasta a hipótese de se estar perante "uma epidemia de mortes." Na sua opinião, o facto de "se viver num meio pequeno torna mais notadas as mortes e cria instabilidade psicológica, mas a Região está dentro dos valores internacionalmente aceitáveis para este tipo de cirurgia que é, sem dúvida, de risco." Mas também afirma que "morrem mais obesos nas Listas de espera + para serem operados do que os do grupo que são submetidos a uma cirurgia".
O chefe da equipa reconhece que "as complicações pós-operatórias são normalmente graves quando ocorrem, não resultam da falta de assistência ao doente mas são inerentes da própria situação, que é de risco." Celso Silva desmente que haja falta de informação completa aos doentes, salientando que são acompanhados antes e depois da operação por enfermeiros, um psicólogo e um Nutricionista + (ambos do hospital), e um endocrinologista de fora. Um dado estranho, quando é sabido que o hospital tem um Serviço de Endocrinologia + próprio.
As mortes mais recentes
Há cerca de 15 dias, um indivíduo com 39 anos de idade submeteu-se à cirurgia para instalar o 'bypass' gástrico. Tudo correu bem, teve alta, mas um dia depois regressou ao hospital e morreu no dia seguinte. Certidão de óbito: Paragem cardíaca + por complicações pós-operatórias. Em Junho deste ano, uma mulher de 33 anos morreu, após a mesma cirurgia. Motivo: sepsis (infecção aguda) devido a complicações pós-operatórias.
Saindo de 2007 e recuando um ano e tal no tempo, uma jovem adolescente, com 100 quilos, submeteu-se também à operação. Os pais, com formação superior, quiseram dar outra qualidade de vida à filha e convenceram-na ao 'bypass' gástrico. Ao terceiro dia da operação, foi vítima de vómitos e febre alta. Morreu. Motivo: sepsis. Os pais não querem se identificar ao DIÁRIO, mas o tempo passa e não apaga a tragédia. Mas alertam: "Sem querer disparar para todas as frentes, achamos que quem está no topo da chefia hospitalar devia procurar tomar medidas no sentido de apurar o que se está efectivamente a passar. Falam-nos em Bactérias + hospitalares que também a terão atingido, mas deverão ter este e outros factos em conta e tomar medidas concretas no sentido de os controlar".
Alertar mais o doente
Ainda a lidar mal com a morte da filha, e a par de outros casos de morte e ainda outras situações em que os doentes enfrentam complicações após dois anos de operação, observam: "Nós não aconselharíamos a ninguém esta operação, pelo menos a ser feita de ânimo leve. Os médicos devem reforçar os alertas no sentido de dizerem que é uma cirurgia de alto risco, deviam falar na possibilidade de morte, deviam preparar os doentes com meses de antecedência para a intervenção e lembrar-lhes que, mesmo com o 'bypass', se não houver disciplina alimentar, surgirão também complicações muito graves." No fundo, procuram sublinhar que "a operação é a etapa quase final de um tratamento e não a inicial ou intermédia." Sendo ainda mais explícitos, e deixando claro que não pretendem responsabilizar a equipa médica, assumem no entanto que encontraram "falhas ao nível da pré-consulta, isto é, na explicação preto no branco dos riscos, inclusive de morte, daquele acto." Qualquer cirurgia tem sempre inerente esse risco, mas sublinham: "Estamos a falar de uma situação muito mais séria que não sabemos se as pessoas estão devidamente informadas".
A exemplo do que afirmou o cirurgião Celso Silva, ser um obeso mórbido é ser um doente crónico com uma vulnerabilidade imunológica considerável. Há todo um historial típico destes doentes, desde a Diabetes + , Hipertensão + , AVC + e morrem tendencialmente mais cedo pela sua debilidade imunológica. A cirurgia visa diminuir os riscos e aumentar mais a qualidade de vida. Mas, de vez em quando, surgem as complicações e quando acontecem são normalmente muito graves e não há antídoto que as combata.
A obesidade mórbida, segundo Celso Silva, nada tem a ver com o peso absoluto de uma pessoa mas com o índice de massa corporal desproporcionado. Com o 'bypass', o estômago é seccionado para criar uma pequena bolsa na parte superior que restringe a quantidade de alimento capaz de ser consumido. Uma parte do intestino delgado é desviada, retardando a mistura do alimento com os sucos digestivos para evitar a absorção calórica completa.
mortalidade no País é grande
O panorama nacional não é nada animador, e é por isso que os profissionais de saúde estão a tentar disciplinar esta área, segundo o DIÁRIO apurou junto do presidente da comissão de avaliação da cirurgia bariátrica, nomeado pela Direcção-Geral de Saúde.
O professor Galvão Telles, catedrático em endocrinologia, não avança no momento com os números mas afirma que "a mortalidade e morbilidade nesta área são superiores ao que devia efectivamente acontecer." Uma situação que ocorre pelo facto de "ainda não estar regulamentada com normas específicas de intervenção a serem aplicadas pelos estabelecimentos de saúde com a consulta bariátrica".
Assim sendo, o vazio legal que actualmente existe deixa a porta aberta a intervenções cirúrgicas provavelmente sem as condições técnicas adequadas, o que se traduz depois numa mortalidade e morbilidade grandes.
Um problema que assume contornos preocupantes, pelo facto de a obesidade constituir um factor de preocupação em Portugal.
Outra questão que também se levanta nesta matéria é a de saber quem deve ser o pivot da consulta bariátrica, se o cirurgião que tem o acto em si nas suas mãos ou se o endocrinologista que tem a radiografia metabólica e não só do doente, e poderá dizer se o mesmo tem ou não indicação para realizar uma cirurgia de risco.
Fonte: DN