Os transplantes de órgãos com colheita em dador vivo estão parados no Hospital de Santa Cruz, em Lisboa, por não existir um seguro que proteja o dador. A lei 22/2007, que regula a colheita e transplante de órgãos, prevê que as instituições hospitalares celebrem seguros a favor do dador. O hospital contactou várias companhias de seguros mas "nenhuma se disponibilizou para o fazer", diz ao DN Pedro Abecassis, director clínico do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental + (CHLO).
Esta norma afecta os oito hospitais autorizados a fazer a colheita de órgãos em vida. No entanto, é no Hospital de Santa Cruz que mais se fazem transplantes de órgãos com dador vivo, apurou o DN. Os transplantes pararam nesta unidade e aguardam que a situação seja desbloqueada.
O cirurgião Eduardo Barroso refere que "existem dificuldades legais há 15 anos". No entanto, o presidente da Autoridade Para os Serviços de Sangue e de Transplan- tação (ASST) explica que "se está a tentar desbloquear a situação. Os hospitais não têm conseguido obter o seguro porque nenhuma companhia de seguros o quis fazer até hoje".
José Miguel Boquinhas, presidente do Conselho de Administração do CHLO, acrescenta que "o problema tem algum tempo, mas as seguradoras não têm conseguido calcular o risco" ligado à colheita.
Cabe aos hospitais garantir a protecção ao dador, mas como tal não tem sido possível, "a ASST está a dialogar com a Associação Portuguesa de Seguradores. Estamos a tentar desbloquear o sistema. Falou-se, até, da hipótese de criar um seguro de caução", diz Barroso.
O DN tentou contactar a Associação Portuguesa de Seguradores, mas não obteve uma resposta em tempo útil. Fonte do Instituto de Seguros de Portugal afirmou, porém, que "a legislação impõe a obrigatoriedade de segurar, mas as seguradoras não são obrigadas a fazê-lo. As partes envolvidas têm de estar em acordo", frisa.
Até agora, o hospital fazia cerca de "cem transplantes com dadores vivos", afirma Eduardo Barroso. Tal como as restantes unidades, fazia-o sem seguro, que já está previsto por lei desde 1993. A lei acabou, assim, por nunca ser cumprida, mas "nunca houve complicações e os doentes nunca ficaram prejudicados", diz. Parte da lei era garantida, nomeadamente o direito à assistência médica, e os dadores ficavam ainda isentos de Taxas moderadoras + .
Maria João Aguiar, responsável da área de colheita da ASST, espera que a "situação seja resolvida o mais rapidamente possível. Mesmo que tenhamos de esperar mais algum tempo, gostaríamos de garantir que a pessoa que é solidária seja protegida. Não podemos ignorar um direito que o dador tem".
Este bloqueio afecta a dádiva de órgãos em vida a casais e amigos, doação que era barrada até à aprovação da nova lei, mas acaba por afectar a doação por familiares, que até agora era feita sem quaisquer problemas. O DN tentou contactar outros hospitais para conhecer a sua situação, mas não teve resposta.
Fonte: DN Lisboa